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‘Economia cripto não é terra de ninguém’, afirma advogado

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Atualizado por Júlia V. Kurtz

EM RESUMO

  • Judiciário brasileiro está de olho no mercado de criptomoedas.
  • História mostra que regulamentação vem sempre depois.
  • Golpes como pirâmides não são exclusividade do mercado cripto.
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Em uma conversa sobre regulamentação para mercado de criptoativos, o advogado Matheus Zilioti, especialista em mercado de capitais, explica que existe um esforço do judiciário brasileiro quando se trata de leis neste ambiente digital especificamente, mesmo ainda sendo um mercado incipiente

Zilioti explica que ainda não temos uma lei específica para a economia cripto, mas o mercado se autorregula para garantir legitimidade e segurança aos serviços prestados. Um exemplo disso é a internet: a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) só foi criada depois de décadas do uso da inovação tecnológica por consumidores.

O advogado acrescenta que o mercado mesmo se ajustou, todos sobreviveram e o mesmo deve acontecer com uma Lei específica para o mercado de criptoativos. Mas isso não significa que consumidores, usuários , clientes e entusiastas de criptomoedas estejam desprotegidos e a mercê de golpistas e hackers.

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Como o mercado jurídico está se preparando para a regulamentação de criptoativos no Brasil?

Hoje nós não temos uma regulamentação específica sobre criptoativos. Existem vários projetos de lei que tratam especificamente ou que tangenciam o tema. Acredito que mais de seis. Mas é importante saber que não existir uma regulamentação específica não quer dizer que o setor não seja regulado.

Quando temos essas tecnologias disruptivas, é muito comum ter um frenesi, quase que um clamor do público em geral por você ter uma regulamentação. O mercado consumidor como um todo fica ansioso e ainda coloca a culpa no Direito, muitos dizendo que os juristas ficaram pra trás, quando na verdade essas inovações são o ciclo natural das coisas – e a história mostra!

Nós costumamos dizer que o Direito está sempre a reboque da sociedade e, sim, o mercado tem que ser regulado, mas temos um direito civil de princípios Romano germânicos, e é um direito que vem sendo aplicado com normas que são utilizadas há mais de 2.000 anos. O nosso código civil de 1916 foi alterado em 2002, mas seguiu praticamente o mesmo.

Hoje, quando falamos de criptoativos, precisamos entender que ele é uma representação digital de um ativo, mas que por trás – no mundo real – esses ativos  já são regulados no nosso código civil. Resumindo, o Direito atual já é aplicado em nosso cotidiano em regulação de contratos de obrigações com bases muito sólidas para resolver grande parte das questões que possam vir existir em relação aos criptoativos.

Quando falamos de teoria de regulação, ela existe como regra geral para resolver problemas que os ativos privados agindo isoladamente no seu interesse, o conseguem resolver sozinho de forma eficiente.

Temos também as iniciativas tanto do Banco Central, como da CVM do que eles chamam de sand box regulatório. Ela é bem ilustrativa, porque de fato é como se fosse o ambiente por um prazo e em determinadas condições que o regulador autoriza o particular a inovar – o que não cabe no mercado tradicional – a desenvolver estruturas que hoje não cabe nas caixinhas regulatórias. Aí é dado o espaço para o mercado se desenvolver.

É quando podemos evoluir, entender as falhas, o que funciona e o que não funciona, o que pode representar um risco e só a partir dessas observações é possível ter uma conclusão sobre em que medida e em que de fato devemos ter uma regulação .

É preciso tomar cuidado com aquela história do remédio não matar o próprio paciente. Uma regulamentação extensiva pode acabar provocando depressão nesse mercado. Portanto é preciso ter uma dosagem regulatória eficiente.

No mercado de criptoativos as pessoas e empresas já fazem e vão continuar a fazer a arbitragem regulatória. Algumas exchanges se mudam para países considerados mais amigáveis a cripto, como Gibraltar, para estruturarem suas operações.

O que eu vejo é que a receita federal, a CVM e o Banco Central tem dado espaço para esse ambiente se desenvolver, mas chega um determinado momento – e eu acho que já chegou – que é quando se atinge uma certa maturidade para seguir para o próximo estágio. Uma consolidação de expansão para oferecer isso a um público maior e às vezes, um público até institucional e mais tradicional no mercado financeiro.

Portanto é preciso estabelecer alguns critérios de confiança e de credibilidade nesse mercado que dêem o subsídio para que as pessoas possam acreditar nele e fazê-lo crescer.

Agentes sérios do mercado querem a regulação por questões que envolvem desde segurança a golpes. Um ambiente completamente desregulado favorece esquemas de pirâmides, mas também não são exclusividade do mundo cripto. Existem desde que cunharam a primeira moeda.  

Ou seja, se você não tem uma regulamentação com critérios básico de conformidade, estrutura operacional, estrutura técnica de transparência e divulgação de informações para os envolvidos, acaba autorizando involuntariamente a entrada de players que não são sérios. E cada escândalo envolvendo a comunidade enfraquece mais os agentes sérios.

Temos iniciativas de autorregulação. Muitos agentes do mercado já estabeleceram políticas próprias para prevenir fraudes e falhas.

Sobre acelerar a regulamentação, qual a sua opinião?

Temos um problema nesses projetos de lei que é o de tratar o criptoativos como uma coisa só. É um problema claro de taxonomia. Os criptoativos funcionam de formas diferentes. Temos os Security Tokens, moedas digitais usadas como meios de pagamentos para determinados serviços ou um ativo que pode ser não fungível como os NFTs. Então são várias aplicações, por isso a necessidade de entender melhor todo o funcionamento, incluindo os problemas, para de fato ter uma regulamentação que funcione igualmente para todos.

Hoje, um contrato dentro de uma representação digital já é regido pelo código civil. Atualmente, no Brasil, o investidor já paga tributo sobre a movimentação de criptomoedas em sua carteira. Se você tem US$ 100 mil em Bitcoin e vende por US$ 200 mil, já existe uma disciplina tributária em relação a essa renda e você inclusive tem que pagar imposto sobre esses valores.

É bom deixar claro que, ao contrário do que muitos pensam, a economia a cripto não é terra de ninguém. Se o consumidor for lesado ao comprar um NFT, está protegido pelo código brasileiro do consumidor, independente da regulamentação.

O judiciário comum pode ser acessado sempre e a Justiça brasileira trabalha com grandes especialistas para tratar do tema, além de promover cursos de atualização para entender melhor o funcionamento desse novo universo.

À medida que o criptoativo assume a característica de um negócio regulado automaticamente, já está sendo regulado.O fato é que estamos vendo a evolução desse mercado e daqui algum tempo saberemos o que funcionou, quais são os problemas reais etc.

Voltando ao exemplo da internet, o protocolo é da década de 1970, mas só começou a se popularizar ao grande público em meados do ano dos anos 1990. E o Marco Civil da internet só foi editado 20 anos depois. E a gente sobreviveu, construímos relações em redes sociais, o e-commerce se desenvolveu e, de novo: não precisamos ficar clamando por regulação naquilo que efetivamente não é necessário.  

Lembro que à época o clamor para regulamentação era muito parecido com o que vemos hoje nos criptoativos. A história se repete. Os períodos de testes são importantes para analisar a evolução e estabelecer critérios para atribuir competência para que seja regulado.

Como o nosso processo legislativo é dificultoso, me parece que o ideal seja estabelecer uma classificação ampla dos tipos de token para a agência reguladora de fato lidar com os técnicos competentes para elaboração dos aspectos mais detalhados da norma.

As corretoras já são reguladas. Elas recebem recursos de terceiros em nome próprio.

O investidor institucional tem um corpo técnico próprio. É assessorado financeiramente juridicamente para saber o que que ele está fazendo, mas quando você pensa no mercado em geral acaba atingindo pessoas que não têm essa complexidade intelectual de entender detalhes daquilo que ela está investindo.

Sempre bom lembrar que todo ativo tem riscos e é volátil podendo trazer perdas aos investidores inexperientes.

Se o cliente tiver conta em uma exchange, pedir para fazer um saque e não for atendido, ele está protegido. Já que existe um contrato, seja ele eletrônico ou em papel, é de direito reivindicar o ativo na Justiça.

Não podemos demonizar o mercado de criptoativos e sim estabelecer critérios mínimos para esses agentes que estão atuando e captando recursos de terceiros em nome próprio.   O fato é que o mercado e a realidade estão sempre à frente do Direito, que reconhece uma realidade e regula. Não tem como regular algo que não se conhece.

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Aline Fernandes
Apaixonada pelo que faz, Aline Fernandes é uma profissional que atua há 20 anos como jornalista. Especializada nas editorias de economia, agronegócio e internacional trabalha na BeINCrypto como editora do site brasileiro. Já passou por quase todas as redações e emissoras do país, incluindo canais setorizados como Globo News, Bloomberg News, Canal Rural, Canal do Boi, SBT, Record e Rádio Estadão/ESPM. Atuou também como correspondente internacional em Nova York e foi setorista de economia...
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